Por Lucimara Mizael, Psicóloga
Na literatura existem alguns termos para definir o brincar. Segundo os autores Cordazzo e Vieira ( 2007) vamos encontrar os termos “brincadeira, brinquedo e jogar”, porém os termos brincar e o jogar são predominantes e estão relacionados às atividades infantis, existindo uma diferenciação entre o brincar (atividade menos controlada) e o jogar que é uma atividade mais controlada com inserção de regras.
De acordo com Windholz (2016) o termo brincar pode ser entendido como uma atividade do desenvolvimento “típico” da criança e esta atividade tende a ocupar muito tempo. O brincar se inicia cedo e continua ocorrendo durante toda a infância. No entanto as brincadeiras mudam de acordo com o desenvolvimento da criança e com as circunstâncias. Del Prette e Meyer (2012) afirmam que o brincar possibilita a criança a expressão dos seus sentimentos e pensamentos e que o brincar e o jogar são uma maneira de controlar o ambiente e aprimorar habilidades sociais e cognitivas. A criança pode brincar sozinha, com outras crianças, de forma paralela e/ou cooperativa, pode ficar sentada, usando as mãos e os pés, aprimorar habilidades motoras, conversar e resolver problemas, sendo assim o brincar além de “divertir” permite o desenvolvimento físico, cognitivo, social e emocional (Windholz, 2016).
Pensando nas crianças com TEA o brincar pode ser fundamental para estimular habilidades que são pré-requisitos para comportamentos mais complexos. Estes pré-requisitos podem ser: contato visual, sentar, imitações (motora ampla, fina, com objetos e oral), seguimento de instruções de um passo ou mais, identificação e emparelhamentos de acordo com o modelo idênticos e arbitrários (partes do corpo, objetos, cores, formas e entre outros) e coordenação motora ampla e fina. (Gomes & Silveira, 2016). Seguindo este raciocínio Lafrance (2018) acrescenta outras habilidades importantes para o desenvolvimento de repertório como copiar vocalizações, mandos/ pedidos, Tato/nomear, iniciar e responder durante conversas com palavras, frases e perguntas.
Relacionando as habilidades citadas acima, dentro de uma brincadeira é possível isolar apenas um comportamento-alvo ensinando uma habilidade por vez ou ensinando mais de uma. Exemplo em um jogo de encaixe:
- Pode se estimular que a criança faça contato visual com o aplicador ou com os pais e, também, realize triangulação do olhar entre objeto e adulto (atenção Compartilhada).
- As instruções de um passo podem ser fornecidas como: “pegue, jogue ou coloque” e, também, é possível deixar dois objetos de comparação e dizer “pegue o azul”.
Durante a brincadeira também pode ser estimulado o uso funcional dos objetos e entre as tentativas podem ser inseridas estimulações de comportamentos-alvo. Quando a criança apresentar dificuldade ou ainda não estiver com aquela habilidade adquirida, podem ser utilizado dicas (prompts). A dica tem o papel de evocar a resposta correta durante as sessões iniciais e precisa ser esvanecida durante o processo. As dicas podem ser fornecidas da mais intrusiva para menos intrusiva, ou seja, no começo será dado muito suporte para a criança realizar a atividade e aos poucos a ajuda será diminuída até a habilidade ficar independente. A dica também pode ser fornecida da menos intrusiva para a mais intrusiva (Mueller, Palkvoc e Maynard, 2007), visando expor a criança a oportunidades de responder de forma independente.
Além das dicas, ao longo das brincadeiras é importante que ocorra reforçamento das respostas esperadas. No início pode-se fazer trocas com a criança, por exemplo: brincar e depois dar acesso a tempo ou outro item de sua preferência”. A princípio é importante fornecer consequências para estas respostas (ofertar itens de alta preferência) e observar se, em apresentações futuras, ocorre aumento da probabilidade da resposta. Caso isso ocorra, esta resposta estará sendo reforçada. Se não houver este aumento na frequência da resposta será importante fornecer um novo item de preferência.
(Catania, 1991). Neste momento será fornecido reforçadores arbitrários (estímulos que não são produto da própria resposta de brincar) estas consequências programadas precisam ocorrer e deve haver planejamento para que a brincadeira com o tempo se torne cada vez mais prazerosa e a criança fique sobre reforçamento natural.
Tendo em vista os aspectos citados ao avaliar e mapear as dificuldades das crianças com atrasos no desenvolvimento torna-se necessário traçar objetivos de ensino Windholz (2016) a fim de maximizar os repertórios citados.
Referências:
Catania, A. C. (1999) Aprendizagem: Comportamento, Linguagem e Cognição. Porto Alegre: Artmed.
Cordazzo, S. T. T. & Vieira, M. L (2007). A brincadeira e suas implicações nos processos de aprendizagem e de desenvolvimento. Estudo e pesquisas de Psicologia. 7(1). 89-101. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1808-42812007000100009
Del Prette, G. & Meyer, S. B. (2012). O brincar como ferramenta de avaliação e intervenção na clínica analítico-comportamental infantil. In N. B. Borges & F. A. Cassas (Orgs.). Clínica analítico-comportamental: aspectos teóricos e práticos.
Gomes, C. G. S & Silveira, A. D. (2016). Ensino de Habilidades Básicas para pessoas com autismo. Curitiba: Editora Appris.
Lafrance. D (2018). Planejando Intervenções Individualizadas. In. A.C. Sella & D. M. Ribeiro ( Orgs.). Análise do Comportamento Aplicada ao Transtorno do Espectro Autista.
Mueller, M. M., Palkovic, C. M & Maynard, C. S. (2007) Errorless Learning: Review and practical application for teaching children with developmental Disorders. Psychology in the Schools. 44 (7). Recuperado de https://doi.org/10.1002/pits.20258
Windholz, M. H. (2016). Passo a passo, seu caminho: guia curricular para o ensino de habilidades básicas. 3ª ed. amp. – São Paulo: Edicon
Sobre a autora:
Lucimara Mizael
Psicóloga
Especialista em Análise do Comportamento Aplicada à atrasos do desenvolvimento e autismo – UFSCAR
Mestranda no Centro Paradigma Ciências e Tecnologias do Comportamento
Colaboradora no Ambulatório TEAMM